2 -O Forno não aquece

Diariamente lá vinha o Santos trazer o pão à messe de sargentos e à messe dos oficiais. Vinha mais para ver como corriam as coisas, para ver se apanhava alguma “boca” sobre a qualidade da obra. Tudo bem, os comentários, se os havia, não eram maus de modo a preocupar o nosso padeiro.
Tudo corria sobre rodas, o Santos era um ex-sapador transformado em padeiro.
Um dia o raio do forno recusou-se a aquecer. A lenha era verde e teimava em não arder. A hora do pão sair aproximava-se e o raio do forno só tinha fumo, quanto ao calor, nem vê-lo. O tempo passava e … nada. A oficina era mesmo ali ao lado e havia sempre por ali latas com gasóleo. Nem hesitou, foi buscar uma lata com gasóleo e, duma assentada, espetou com ela dentro do forno. Remédio santo! Acendeu-se toda a lenha duma maneira que o forno parecia a fornalha do navio a toda a pressão. O Santos e o forneiro tiveram que se afastar pois o calor era tanto que não aguentavam estar perto da fornalha. Consumida a lenha o forno ficou rapidamente no ponto para mais uma fornada. E aí vai disto!
Cozido o pão lá foi o Santos na rotina diária fazer a entrega, primeiro à companhia que tomava sempre o pequeno-almoço mais cedo, depois à messe de sargentos e, por fim, à messe de oficiais.
Quando os soldados começaram a tomar o pequeno-almoço começaram as exclamações. - Esta porcaria só sabe a petróleo! – Dizia um.
- Em vez de água puseste petróleo na farinha? – Dizia outro.
- Que coma o padeiro o pão a ver se gosta! Bolas, não se consegue comer, até fica a boca a saber a petróleo!
O Santos ao ouvir estas exclamações entrou em pânico. “Meu Deus”, pensou ele, “o que eu arranjei com a porcaria do gasóleo”!
Foi de imediato ter com o forneiro, cujo nome ignoro (lamento) e disse-lhe:
- Estamos perdidos. Temos que fazer de imediato vinte pães e a toda a pressa.
- Vinte pães!? Exclamou o forneiro, intrigado. Se faziam diariamente mais de trezentos para que serviam vinte pães?
O Santos, preocupado, mas sem perder o tino à coisa, exclamou logo:
- São os que são precisos para o pequeno-almoço dos oficiais. Para o almoço fazemos nova fornada.
- Então, e os outros? Vão comer o pão assim?
- Paciência! Os oficiais é que não podem dar conta que o pão sabe a gasóleo ou então estou perdido. Com os outros é mais barulho menos barulho, mas não passa disso.
Numa corrida foi à messe de oficiais buscar o pão que lá tinha deixado, dizendo ao faxina que voltaria dentro de pouco tempo com novo saco de pão, que se tinha enganado e aquele não era para ali.
Dentro de pouco tempo novo saco de pão, com o mínimo indispensável para o pequeno-almoço, estava na messe de oficiais e o Santos respirava de alívio. Bem reclamaram os soldados, cabos, furriéis e sargentos, mas que adiantaram! O Santos desculpava-se como podia atribuindo as culpas ao forno que tinha um problema e não ardia. O certo é que ao almoço o pão já tinha o seu gosto normal, devido à nova fornada, e o incidente acabou por ser esquecido e, para alguns, os oficiais, nem sequer chegou a haver incidente nenhum. O Santos podia dormir descansado!
Milton Sá

Sem comentários:

Enviar um comentário